Posição acerca do Aborto
da Igreja Católica Ortodoxa Hispânica

A foto acima descrita, corresponde a uma intervenção cirúrgica para espinha bífida, realizada dentro do útero materno num feto de apenas 21 semanas de gestação, numa autêntica proeza médica, no momento em que o bebé tirou a sua mão pequena do interior do útero da mãe, tentando segurar um dos dedos do médico que o operava. Esta mão pequena que comoveu o mundo pertence a Samuel Alexander, nascido em 28 de Dezembro 1999 (no dia da foto ele tinha 3 meses de gestação). Quando pensamos bem nisto, a foto é ainda mais eloquente. A vida do bebé está literalmente por um fio; os especialistas sabiam que não conseguiriam mantê-lo vivo fora do útero materno e que deveriam tratá-lo lá dentro, corrigir a anomalia fatal e fechá-lo para que o bebé continuasse seu crescimento normalmente.
A história por trás da imagem reflecte a luta e a experiência passadas por um casal que decidiu esgotar todas as possibilidades, até o último recurso, para salvar a vida do seu primeiro filho. Essa é a odisseia de Julie e Alex Arms, que moram na Geórgia, Estados Unidos. Eles lutaram durante muito tempo para ter um bebé. Julie, enfermeira de 27 anos de idade, sofreu dois abortos antes de ficar grávida do pequeno Samuel. Porém, quando, completou 14 semanas de gestação, começou a sofrer cãibras fortes, e um teste de ultra-som mostrou as razões. Quando foi revelada a forma do cérebro e a posição do bebé no útero, o teste comprovou problemas sérios. O cérebro de Samuel estava mal-formado e a espinha dorsal também mostrou anomalias.
De acordo com Alex, 28 anos, engenheiro aeronáutico, eles sentiram-se destruídos pelas notícias, mas o aborto nunca seria uma opção. Em vez de se deixar ir abaixo, o casal decidiu procurar uma solução pelos seus próprios meios e foi então que ambos começaram a procurar ajuda. A mãe de Julie encontrou a notícia dos detalhes de uma cirurgia fetal experimental, desenvolvida por uma equipa da Universidade de Vanderbilt. Deste modo, entraram em contacto com o Dr. Joseph Bruner (cujo dedo Samuel segura na foto) e começou uma corrida contra o tempo.
Uma espinha dorsal bífida pode levar a danos cerebrais, gerar paralisias diversas e até mesmo uma incapacidade total. Porém, quando pode ser corrigido antes de o bebe nascer, muitas são as chances de cura. Apesar do grande risco por o bebe não poder nascer ainda naquele momento, os Arms decidiram recomendá-lo a Deus. A operação foi um sucesso. Nela, os médicos puderam tratar o bebé, cujo tamanho não era maior do que o de um porquinho da índia - sem o tirar do útero, fechar a abertura originada pela deformação e proteger a coluna vertebral de modo a que os sinais vitais nervosos pudessem ir agora para o cérebro. Samuel tornou-se o paciente mais jovem que foi submetido a esse tipo de intervenção.

Com 7 semanas, 5 semanas após a concepção

O que nos diz a ciência?

No século XIX descobriu-se que a partir da concepção tínhamos um novo ser humano e que, por isso, o aborto consistia em matar deliberadamente um ser humano inocente. Interessa, pois, saber se desde então foi feita alguma descoberta científica que anulasse ou questionasse as descobertas desse século.
Os livros a seguir citados são usados em cerca de 80% das Faculdades de Medicina dos Estados Unidos da América e em muitos outros países do mundo. Os sublinhados foram acrescentados ao texto.
1 - "Zigoto. Esta célula resulta da fertilização de um oócito por um espermatozóide e é o início de um ser humano... Cada um de nós iniciou a sua vida como uma célula chamada zigoto." (K. L Moore. The Developing Human: Clinically Oriented Embryology (2nd Ed., 1977), Philadelphia: W. B. Saunders Publishers).
2 - "Da união de duas dessas células [espermatozóide e oócito] resulta o zigoto e inicia-se a vida de um novo indivíduo. Cada um dos animais superiores começou a sua vida como uma única célula." (Bradley M. Palten, M. D., Foundations of Embryology (3rd Edition, 1968), New York City: McGraw-Hill).
3 - "A formação, maturação e encontro de uma célula sexual feminina com uma masculina, são tudo preliminares da sua união numa única célula chamada zigoto e que definitivamente marca o início de um novo indivíduo". (Leslie Arey, Developmental Anatomy (7th Edition, 1974). Philadelphia: W. B. Saunders Publishers).
4 - "O zigoto é a célula inicial de um novo indivíduo." (Salvadore E. Luria, M. D., 36 Lectures in Biology. Cambridge: Massachusetts Institule of Technology (MIT) Press).
5 - "Sempre que um espermatozóide e um oócito se unem, cria-se um novo ser que está vivo e assim continuará a menos que alguma condição específica o faça morrer:" (E. L. Potter, M. D., and J. M. Craig, M. D Palhology of lhe Fetus and lhe lnfant, 3rd Edition. Chicago: Year Book MedicaI Publishers, 1975.).
6 - "O zigoto (...) representa o início de uma nova vida." (Greenhill and Freidman's, Biological Principies and Modem Practice of Obstetrics).
Como já se disse o valor científico destas afirmações é inquestionável, pois constam dos livros adoptados pela maioria das Faculdades de Medicina dos EUA e de outros países.
Em 1971 o Supremo Tribunal de Justiça dos EUA pediu a mais de duzentos cientistas, entre os mais prestigiados especialistas americanos, que elaborassem um relatório sobre o desenvolvimento embrionário. Esse documento diz o seguinte:
" Desde a concepção a criança (1) é um organismo complexo, dinâmico e em rápido crescimento. Na sequência de um processo natural e contínuo o zigoto irá, em aproximadamente nove meses, desenvolver-se até aos triliões de células do bebé recém-nascido. O fim natural do espermatozóide e do óvulo é a morte, a menos que a fertilização ocorra. No momento da fertilização um novo e único ser é criado, o qual, embora recebendo metade dos seus cromossomas de cada um dos progenitores, é completamente diferente deles". (Amicus Curiae, 1971 Motion and Brief Amicus Curiae of Certain Physicians, Professors and Fellows of the American College of Obstetrics and Gyneco1ogy, Supreme Court of the United States, October Term, 1971, No. 70-18, Roe v. Wade, and No. 70-40, Doe v. Bolton).
Em 1981 o Senado dos EUA estudou a chamada Human Life Bill. Para o efeito ouviu durante oito dias os maiores especialistas do mundo na questão (americanos e não só). Ao todo foram feitos cinquenta e sete depoimentos. No final, o relatório oficial dizia o seguinte:
" Médicos, biólogos e outros cientistas concordam em que a concepção marca o início da vida de um ser humano - um ser que está vivo e que é membro da nossa espécie. Há uma esmagadora concordância sobre este ponto num sem-número de publicações de ciência médica e biológica." (Report. Subcommittee on Separation of Powers to Senate Judiciary Committee 5-158. 97th Congress. 1st Session 1981. p. 7.).

Conclusão:

1. A partir do momento da concepção, do ponto de vista biológico, temos um ser vivo. A expressão "ser vivo", aparece nesta frase com o mesmo valor e significado com que aparece na frase "A Rainha de Inglaterra, do ponto de vista biológico, é um ser vivo".
2. Este ser vivo está individualizado.
3. Este ser vivo pertence a uma espécie definida: a espécie à qual pertencem todos os seres humanos.
4. A partir do momento da concepção, do ponto de vista biológico, temos um ser vivo, individualizado e humano. Estas palavras têm todas exactamente o mesmo valor e significado com que aparecem na afirmação "A Rainha de Inglaterra, do ponto de vista biológico, é um ser vivo, individualizado e humano".
Está completamente fora de dúvidas que o aborto mata um ser humano. Aos defensores do aborto resta explicar como se pode defender a morte arbitrária de seres humanos inocentes.

Notas:
(1) No original: "From conception the child (...)". Muitas pessoas pretendem que o aborto não mata um bebé: o que mata é um feto. É curioso notar que duzentos especialistas americanos elaboraram um texto onde começam por se referir à "criança" e não ao feto ou ao zigoto. Também no livro de Baruch Brody, Abortion and the Sanatity of Human Life, MIT Press, 1975, ele afirma que enquanto não conseguir distinguir feto de criança rejeitará a palavra feticídio usando indistintamente a palavra homicídio.

Desenvolvimento do embrião e do feto
(resumo)

Semana 0:
A concepção é o momento no qual o esperma penetra no óvulo. Uma vez fertilizado denomina-se «zigoto», até que alcance o útero 3-4 dias mais tarde.

Semana 2:
O embrião pode flutuar livremente no útero por 48 horas, antes da implantação. Após a implantação, ligações complexas entre a mãe e o embrião desenvolvem-se para formar a placenta.

Semana 4:
O embrião tem 4-6 mm de comprimento. Um coração primitivo começa a bater. Cabeça, boca, fígado e intestinos começam a tomar forma.

Semana 8:
O embrião tem agora cerca de 25 mm de comprimento. Traços faciais, membros, mãos, pés, dedos e unhas tornam-se aparentes. O sistema nervoso está receptivo e muitos dos órgãos internos começam a funcionar.

Semana 12:
O feto tem agora 5-8 cm de comprimento e pesa quase uma onça (28,35 gramas) – 10-45g. Os músculos começam a desenvolver-se e os órgãos sexuais a formar-se. Começam também a formar-se as pálpebras, as unhas das mãos e as unhas dos pés. Podem ser observados movimentos espontâneos da criança.

Semana 16:
O feto tem agora cerca de 9-14 cm de comprimento. A criança pestaneja, agarra e move a sua boca. O cabelo cresce na cabeça e o pelo no corpo.

Semana 20:
O feto pesa agora aproximadamente 250-450 gramas e mede cerca de 15-19 cm da cabeça aos pés. As glândulas sudoríferas desenvolvem-se e a pele exterior transformou-se de transparente em opaca.

Semana 24:
O feto agora pode inalar, exalar e até chorar. Os olhos estão completamente formados e a língua desenvolveu o gosto. Sob cuidados médicos intensivos, o feto tem mais de 50% de hipóteses de sobreviver fora do útero.

Semana 28:
O feto, geralmente, é capaz de viver fora do útero da mãe e será considerado prematuro à nascença.

Semana 38:
Isto marca o final do período normal de gestação. A criança está agora preparada para viver fora do útero da sua mãe.

Nota:
Nesta tabela, descreve-se o desenvolvimento típico do embrião ou do feto segundo o critério dos embriologistas - os especialistas nesta matéria, ou seja, contando o tempo a partir do momento da concepção. Os obstetras, porém, como não é fácil determinar com exactidão quando acontece a concepção, contam "as semanas de gravidez" a partir do primeiro dia do último ciclo menstrual da mulher (que acontece sensivelmente duas semanas antes da concepção).

Desenvolvimento do embrião e do feto
(resumo)

Primeiro trimestre:


A criança não-nascida com sete semanas (5 semanas depois da concepção)

“Há uns anos atrás, ao dar uma anestesia por causa de uma ruptura da trompa de falópio numa gravidez (aos dois meses), deparei-me com o que acreditei ser o ser humano mais pequeno alguma vez visto. O saco embrionário estava intacto e transparente. Dentro do saco estava um minúsculo rapaz humano, nadando vigorosamente dentro do líquido amniótico, estando agarrado à parede uterina pelo cordão umbilical. O minúsculo ser humano estava perfeitamente desenvolvido com dedos longos e suaves, pés e unhas. A sua pele era quase transparente e as artérias delicadas e as veias eram proeminentes até ao final dos dedos. O bébé estava perfeitamente vivo e não parecia, de maneira nenhuma, como as fotografias e os desenhos de “embriões” que eu tinha visto. Quando o saco foi aberto, o minúsculo ser humano imediatamente perdeu a vida e tomou a forma do que é aceite como a aparência de um embrião nesta fase, extremidades rombas, etc.

(Paul E. Rockwell, M.D.)

0 Semanas
Fertilização: o esperma e o óvulo juntam-se na trompa de falópio para formar um ser humano excepcional (único). Unem-se quarenta e seis cromossomas que pré-determinam tudo sobre as características físicas de uma pessoa.

A fotografia em cima é de um óvulo fertilizado, trinta horas depois da concepção. Ampliado aqui, não é maior que uma cabeça de alfinete. Constantemente a dividir-se rapidamente, o embrião em desenvolvimento, chama-se nesta fase zigoto, flutua da trompa de falópio em direcção ao útero.

1 Semana
Uma vez no útero, o embrião em desenvolvimento chamado blastocito, procura por um bom local para se implantar, debaixo da superfície do útero. O saco vitelino, que se mostra à esquerda (da página anterior), produz células sanguíneas durante as primeiras semanas de vida. A criança não-nascida tem menos de 0,2 mm de comprimento mas, está a desenvolver-se rapidamente. A coluna vertebral, a espinal-medula e o sistema nervoso estão a formar-se. Os rins, o fígado e os intestinos estão a tomar forma.

2 Semanas
O embrião produz hormonas que fazem cessar o ciclo menstrual da mãe.

3 Semanas
O embrião tem o tamanho de uma passa. No vigésimo-primeiro dia (21), o coração minúsculo do embrião começou a bater. O tubo neural alarga-se em três partes, em breve tornando-se um cérebro muito complexo. A placenta começa a funcionar. A espinha e a espinal medula crescem mais rapidamente que o resto do corpo, nesta fase, e dão a aparência de uma cauda. Isto desaparece à medida que a criança cresce.

5 Semanas
São visíveis traços faciais, incluindo a boca e a língua. Os olhos têm retina e lentes. O principal sistema muscular está desenvolvido e a criança não-nascida pratica o movimento. A criança tem o seu próprio tipo de sangue, distinto do da mãe. Estas células sanguíneas são agora produzidas pelo fígado em vez do saco vitelino.

6 Semanas
A criança não-nascida, chamada feto, nesta fase, tem cerca de 9-14 mm de comprimento. A pessoa minúscula está protegida pelo saco amniótico, cheio de líquido. Lá dentro, a criança nada e move-se graciosamente. Os braços e as pernas aumentaram de comprimento e podem ver-se os dedos. Os dedos dos pés vão desenvolver-se nos próximos dias. Podem medir-se as ondas cerebrais.

8 Semanas
O coração está quase completamente desenvolvido e parece-se muitíssimo com o do bébé recém-nascido. Uma entrada no átrio do coração e a presença de uma válvula de circulação desvia grande parte do sangue dos pulmões, dado que o sangue da criança é oxigenado através da placenta. Vinte minúsculos dentes de leite estão a formar-se na mandíbula.

10 Semanas
As cordas vocais estão completas e a criança pode (e fá-lo muitas vezes, diga-se a verdade!) chorar (silenciosamente). O cérebro está completamente formado e a criança pode sentir dor. O feto pode até chuchar o seu polegar. As pálpebras cobrem agora os olhos e manter-se-ão fechadas até ao sétimo mês para proteger as delicadas fibras nervosas ópticas.

Segundo trimestre:

“A vida está presente desde o momento da concepção.”
(Dr. Jerome Lejeune, o falecido professor e geneticista célebre mundialmente, Universidade de Descartes, Paris)

“ Uma pessoa é uma pessoa, por mais pequena que seja!”
(“Horton Hears a Who”, pelo Dr. Seuss, o falecido e famoso autor de livros infantis)

12 Semanas
Os músculos aumentam de comprimento e tornam-se organizados. A mãe começará a sentir, em breve, os primeiros batimentos da criança não-nascida, pontapeando e movendo-se dentro da sua barriga.

13 Semanas
O feto tem o sentido do gosto de um adulto e é capaz de saborear as refeições da mãe.

14 Semanas
Tem 9-14 cm de altura e só seis onças (uma onça = 28,35 gramas) de peso, aparecem as sobrancelhas, pestanas e cabelo fino. A criança pode agarrar com as suas mãos, dar pontapés ou até dar cambalhotas.

18 Semanas
A criança pode ouvir e reconhecer a voz da mãe. Embora ainda pequeno e frágil, o bébé está a crescer rapidamente e poderá possivelmente sobreviver se nascer nesta fase. São visíveis os órgãos sexuais. O médico pode dizer se a criança é uma rapariga ou um rapaz ao usar um aparelho de ultra-som. Em cima, à direita, é uma rapariga.

Terceiro trimestre

22 Semanas
Aos cinco meses e meio, a criança não-nascida está coberta com um cabelo fino e felpudo chamado lanugo. A sua face tenra está protegida por uma substância tipo cera chamada vernix. Um pouco desta substância pode ainda estar na pele da criança à nascença e será logo rapidamente absorvida. A criança pratica a respiração pela inalação do líquido amniótico para os pulmões em desenvolvimento.

28 Semanas
Por vários meses, o cordão umbilical tem sido a linha de vida que liga o bébé à mãe. A alimentação é transferida do sangue da mãe, através da placenta, para dentro do cordão umbilical para o feto. Se a mãe ingere quaisquer substâncias tóxicas, tais como drogas ou álcool, o bébé recebe-as também.

30 Semanas
O bébé dorme 90-95% do dia e, às vezes, passa pelo sono REM (Rapid Eye Movement = Movimento Rápido do Olho).

38 Semanas
O bébé, tem agora aproximadamente 3000-3400 gramas, está preparado para a vida fora da barriga da sua mãe. No nascimento, a placenta vai desprender-se do útero e o cordão umbilical deixará de funcionar assim que a criança respire o ar pela primeira vez. A respiração da criança desencadeará mudanças na estrutura do coração e nas artérias circulatórias, o que forçará todo o sangue a viajar, agora, pelos pulmões.


Sobre as fotografias:
Muitas das fantásticas fotografias aqui mostradas foram tiradas do excelente CD ROM Nine Month Miracle (O Milagre dos Nove Meses), por A.D.A.M. Software, Inc. e do livro A Child Is Born (Uma Criança Nasceu) do famoso fotógrafo sueco Lennart Nilsson.

A breve história do aborto

"Nem sempre se tem em conta que as leis que proíbem o aborto (...). Essas leis, que em geral proíbem o aborto consumado ou tentado em qualquer altura da gravidez salvo quando é necessário para salvar a vida da grávida, não têm origem em tempos remotos. Antes, essas leis foram aprovadas, na maior parte dos casos, nos finais do século XIX...".

(Roe vs Wade. Supremo Tribunal de Justiça dos E.U.A. 1973)

Em poucas palavras pode-se dizer o seguinte: o aborto foi sempre muito perigoso, pelo que era raro e, quando se fazia, ou falhava ou matava mãe e filho (Havia dois tipos de métodos: químicos e físicos. Os primeiros consistiam em venenos que se esperava matassem o filho mas não a mãe; os segundos consistiam em traumatismos diversos: pancadas no abdómen, montar a cavalo horas a fio, etc. Estes métodos, além de poderem matar a mãe, provocavam muitas lesões). O resultado de tudo isto é que o infanticídio acabou por ser preferido ao aborto (Quando os portugueses chegaram ao Japão, no séc. XVI, numa altura em que a cultura europeia era contra o infanticídio, ficaram impressionados com a facilidade e frequência com que as japonesas matavam os seus filhos recém-nascidos). A Igreja Católica Romana (assim como a Igreja Ortodoxa Oriental) condenavam o aborto - o aborto aparece explicitamente condenado na primeira página de um escrito cristão do século I, o Didaque - mas os seus teólogos e moralistas discutiam diferentes graus de gravidade. Em geral, na Europa e na América, as leis civis seguiam a lei canónica (Até ao dia 15 de Agosto de 1930, as Igrejas Cristãs estavam de acordo na proibição do aborto. Nessa data, em Lambeth, os Anglicanos passaram a aceitar o aborto em certos casos).
Por volta de 1750 encontrou-se uma técnica de aborto que, embora continuasse a matar muitas mães, constituiu um enorme "progresso" (É possível que esta técnica tenha sido, de facto, uma redescoberta. Tertuliano (150-225), no Tratado da alma, descreve um método de aborto muito parecido com o actual dilatação e extracção).
Na sequência da descoberta que permitia abortos com, comparativamente, alguma segurança, a rejeição do aborto abrandou e este chegou mesmo a ser legalizado em muitos Estados. E, quer fosse legal quer não, o aborto no século XIX tomou-se uma prática muito vulgar.
Contudo, a legalização teve por base os conhecimentos científicos da época. De grosso modo, pensava-se que cada espermatozóide é um homem que se limita a crescer dentro do útero. Porém, em 1827 Karl Emst von Boar descreveu pela primeira vez o processo de concepção, e em meados do século XIX os médicos estavam já completamente convencidos da existência desse processo. Muitos médicos iniciaram então uma campanha para proibir o aborto. A frase que todos pensam ter sido inventada pelo Vaticano "a vida humana começa no momento da concepção", data, de facto, dessa campanha iniciada pelos cientistas no século XIX. Um outro slogan dessa campanha era precisamente "adopção em vez de aborto" (No original: "Adoption not abortion").
Na sequência de todos estes sucessos, o Parlamento inglês baniu o aborto, em 1869, aprovando o Offences Against the Person Act. Foi o primeiro país a fazê-lo. Por seu lado a American Medical Association, em dois relatórios (1857 e 1870), estabeleceu sem margem para dúvidas que o aborto era inaceitável.
No relatório de 1871 pode-se ler o seguinte: "A única doutrina que parece estar de acordo com a razão e a fisiologia é aquela que coloca o inicio da vida no momento da concepção. (...) O Aborto é uma destruição massiva de crianças por nascer. (...) A proibição de matar aplica-se a todos sem excepção, independentemente do ponto de desenvolvimento em que a vitima está. (...) Seria uma traição à profissão que um médico fizesse um aborto. Os médicos que o fazem desonram a medicina, são falsos profissionais, assassinos cultos e carrascos."
Para o relatório de 1851, o aborto é "o massacre de um número sem fim de crianças".
Na sequência destes dois relatórios, o aborto foi proibido praticamente por toda a parte (O leitor interessado em aprofundar a questão poderá consultar J. Dellapenna, The History of Abortion, Technology, Morality. and Law. University of Pittsburgh Law Review. 1979).
No Diário da Assembleia da República Portuguesa, de 20 de Fevereiro de 1997, páginas 327 e 328, aparece um breve esboço histórico sobre o aborto. Curiosamente, o relator fala de muitos gregos que aceitavam o aborto (o relator não diz que eles - isto é, Aristóteles e Platão - aceitavam também o infanticídio) e refere um médico - Asclepíades - mas esquece-se de referir Hipócrates e o seu juramento, que proíbe explicitamente o aborto, e que todos os médicos são obrigados a jurar. O relator fala do aborto na Idade Média (ponto 8, p. 328) e passa para o aborto nos anos 60/70 do século XX... como se a proibição do aborto viesse da Idade Média. Também não explica por que foi proibido o aborto no século XIX, que é o ponto crucial em toda esta questão.

Uma escolha contra a mulher

O aborto é frequentemente apresentado como um problema de "direito das mulheres". É visto como algo desejável para as mulheres, e como um benefício ao qual elas deveriam ter tanto acesso quanto possível. Na verdade, ser "pró-vida" é visto como sendo "contra os direitos da mulher". Se você às vezes pensa desta forma, examine os factos apresentados aqui. Verá que, na verdade, o aborto prejudica a mulher, ignora os seus direitos, abusa e degrada. Qualquer um que se preocupa com a mulher fará bem em conhecer estes factos.
Estudos de mulheres que fizeram aborto, (veja, por exemplo, o livro do Dr. David Reardon, Aborted Women, Silent No More), mostram que o aborto não é uma questão de dar à mulher uma "escolha". É, tragicamente, uma situação em que as mulheres sentiram que não tinham NENHUMA ESCOLHA, sentiram que ninguém se importava com elas e com seu bebé, dando-lhes alternativa alguma a não ser o aborto. A mulher sente-se rejeitada, confusa, com medo, sozinha, incapaz de lidar com a gravidez - e, no meio disto tudo, a sociedade diz-lhe, "Nós eliminaremos o seu problema eliminando o seu bebé. Faça um aborto. É seguro, fácil, e uma solução legal".
O facto é que embora o aborto seja legal em alguns países, ele NÃO é seguro e fácil, nem respeita a mulher.
Carol Everett costumava trabalhar numa clínica de aborto. Ela agora é pró-vida, e conta como as mulheres não recebem toda a verdade sobre o procedimento do aborto. Quando elas perguntam "É doloroso?", é-lhes dito "Não", apesar de dores graves fazerem parte do processo. Quando elas perguntam, "É um bebé?", é-lhes dito "Não". Muitas mulheres descobriram só DEPOIS do seu aborto que seu bebé já tinha braços, pernas, e chupavam o dedo, antes de serem abortados. Os funcionários das clínicas recebem ordens de não oferecer nenhuma outra informação se lhes for perguntado. Por que é que nós não respeitamos as mulheres o suficiente para lhes dizer toda a verdade?
Nada é dito às mulheres sobre os muitos efeitos prejudiciais psicológicos e físicos do aborto. O aborto NÃO é seguro. Existem, por exemplo, quinze factores de risco psicológico que devem ser investigados antes deste procedimento. E eles normalmente não são investigados. Mulheres que fizeram aborto têm duas vezes mais probabilidade de aborto espontâneo se ficarem grávidas novamente. Uma das razões disto é a "incompetência cervical". Durante um aborto o músculo cervical é distendido e aberto apressadamente, e consequentemente pode ficar muito fraco para permanecer fechado para uma outra gravidez. Outra complicação é a gravidez ectópica (gravidez extra-uterina, fora do útero), uma situação de risco de vida na qual, por causa do tecido fibroso no ventre devido à raspagem do aborto, um óvulo fertilizado é impedido de entrar no útero e assim começa a crescer no tubo falopiano e por fim o rompe. Desde que o aborto foi legalizado nos Estados Unidos, os casos de gravidez ectópica cresceram 300%. Muitas outras complicações físicas podem surgir, como mostra o quadro abaixo. Também tem sido provado que complicações e morte de mulheres que fizeram aborto são relatados em BAIXA ESCALA, e registados sob causas diferentes do aborto.
Efeitos psicológicos são também muito reais. As mulheres sofrem de PAS (Síndrome Pós-Aborto). Elas experimentam o "luto incluso"; ou seja, uma dor que contamina o seu interior como um pus porque elas e outros negam que uma morte real ocorreu. Por causa desta negação, o luto não pode propriamente existir, mas mesmo assim a dor da perda ainda está lá. Muitas têm flashbacks da experiência do aborto, pesadelos sobre o bebé, e até mesmo sofrimento no aniversário da morte. Uma mulher testemunhou que ainda sofre pelo aborto feito há 50 anos atrás! Ninguém preocupado com as mulheres pode responsavelmente ignorar estes factos.

Os Efeitos do Aborto

Este quadro preparado pela WEBA. Women Exploited by Abortion (Mulheres Exploradas pelo Aborto), é como um alerta para outras mulheres evitarem os riscos da cirurgia de aborto.

Efeitos Físicos

Esterilidade
Abortos espontâneos
Gravidez ectópica
Natimortos
Hemorragias e Infecções
Choques e comas
Ú tero perfurado
Peritonite
Febre / Suor Frio
Dor intensa
Perda de órgãos do corpo
Choros / Suspiros
Insónia
Perda de apetite
Exaustão
Perda de peso
Nervosismo
Capacidade de trabalho diminuída
Vómitos
Distúrbios gastro-intestinais

Efeitos Psicológicos

Sentimento de culpa
Impulsos suicidas
Pesar / Abandono
Arrependimento / Remorso
Perda da fé
Baixa auto-estima
Preocupação com a morte
Hostilidade / Raiva
Desespero / Desamparo
Desejo de lembrar da data de nascimento
Alto interesse em bebés
Frustração do instinto maternal
Ó dio por pessoas ligadas ao aborto
Desejo de terminar o relacionamento com o parceiro
Perda de interesse sexual / Frigidez
Incapacidade de se auto-perdoar
Pesadelos
Tonturas e tremores
Sentimento de estar sendo explorada
Horror ao abuso de crianças

Que tipo de preocupação pelas mulheres existe quando colocamos mais esforço em matar a criança do que em ajudar a mulher a manter seu filho? A mentalidade do aborto vê a gravidez como uma doença. Ela não leva a mulher a sério no seu privilégio único de poder gerar uma nova vida!
Alguns dizem que o movimento pró-vida é controlado por homens tentando controlar as mulheres. Mas você alguma vez notou que a indústria do aborto é controlada principalmente por homens, que ganham um monte de dinheiro fazendo esta cirurgia degradante nas mulheres? O aborto não leva o sexo a sério, também. Pelo contrário, fica mais fácil para os homens explorarem as mulheres sexualmente. Rosemary Bottcher, uma feminista pela vida, escreveu: "O aborto reduz as mulheres ao status de máquinas de fazer sexo que podem ser "consertadas" se for necessário. O aborto ajuda a aliviar a ansiedade do homem pelo sexo e liberta-o do último vestígio de responsabilidade. O sexo é realmente livre, afinal!".
Muitas mulheres perceberam estes factos, e formaram a Coalisão Nacional de Mulheres pela Vida (National Women's Coalition for Life). Vamos parar de nos enganar dizendo que o aborto é um "direito" da mulher. O movimento pró-vida oferece às mulheres milhares de centros espalhados pelo mundo onde elas podem encontrar compaixão, assistência, alternativas reais e escolhas que oferecem vida. O movimento do aborto oferece-lhes nenhuma escolha, excepto um corpo ferido, uma mente marcada, e um bebé morto.
A escolha é óbvia.

" Não se opor ao erro é aprová-lo, não defender a verdade é suprimi-la".
S. Felix

Devemos condenar as mulheres que abortaram?

A tenebrosa encenação de propaganda abortista que rodeou o conhecido "julgamento de Aveiro" foi nitidamente orquestrada e minuciosamente programada. Goebbels não faria melhor.
O protagonista principal, ou seja, a grande vítima, isto é, a criança eminentemente débil e vulnerável - brutalmente queimada em solução salina, decapitada, desmembrada, esquartejada, triturada, lançada no esgoto imundo e fétido -, andou sempre arredada dos debates, esquecida dos comentadores, ignorada por todos. Por muito que nos custe, importa ter consciência de que se trata de um ser humano, uma pessoa como nós, absolutamente inocente e indefesa, que é submetida, propositadamente - o aborto é directamente provocado -, a uma violência homicida, bárbara e cruel. Por isso este crime perverso e abominável nunca é solução, mesmo última, a não ser que se entenda que é a "solução final" - termo usado pelos nazis para se referirem ao genocídio dos judeus (a propósito, Nuremberga condenou 10 líderes nazis por "encorajarem e coagirem ao aborto", acto que o tribunal caracterizou como "um crime contra a humanidade" - Michael Schwartz, "Abortion The Nazi Connection." News¬letter of the Catholic League for Religious and Civil Rights, August 1978, p. 1).
Ora o Estado de Direito, a Justiça, não pode "dar ao agressor uma garantia de que a sua vítima não será protegida" (M. Schooyans), despenalizando ou legalizando o aborto. Pelo contrário, tem o dever primordial de garantir o direito fundamental à vida, reconhecendo e tutelando a dignidade de toda a pessoa, isto é, de todo e qualquer ser vivo pertencente à espécie biológica humana, desde o momento da concepção até à morte natural - a abstrusa defesa da não coincidência entre ser humano e pessoa não passa de uma perigosa discriminação absurda, de triste memória, que permitiu, por exemplo, a escravatura, nos USA (séc. XIX), e o holocausto dos judeus, na Alemanha nazi (séc. XX). Deste modo o Estado não pode, sob pena de se tornar totalitário, renunciar à protecção de uma categoria inteira de seres humanos, os nascituros, colaborando tiranicamente na sua execução à morte através dos seus serviços de saúde.
Acresce que um número significativo das mulheres adolescentes, jovens ou adultas - (faz-se esta distinção para que se não esqueça que há uma quantidade imensa de mulheres exterminadas pelo aborto - o sexo está determinado desde o exacto momento da fecundação) - que recorrem ao aborto, fazem-no porque são pressionadas, mesmo violentadas, iludidas e manipuladas - quer por homens, quer por outras mulheres. Ora o Estado não pode ficar de braços cruzados perante o crime medonho de quem incita e obriga, pela força ou pela sedução, outrem a cometer um crime hediondo. Pelo contrário tem, como é evidente, o dever estrito e grave de procurar evitar que assim seja. A indiferença fria pelo destino destas mulheres, interiormente agrilhoadas, gera um desleixo e mesmo uma cumplicidade (ou é sinal deles) com uma propaganda generalizada, em que estão implicados grande parte dos meios de comunicação social, do poder político e do económico, cujo objectivo visa a destruição do eu, de modo a suscitar, em especial da parte das mulheres, embora não exclusivamente, o consentimento à própria alienação. É isso que explica a presença de um número preocupante destas reivindicando, em nome da liberdade, o "direito", a esmagar a liberdade e o direito à vida - fundamento e origem de todos os demais direitos -, dos outros (os nascituros) aniquilando a vida que lhes dá lugar.
A liberdade ludibriada, forçada ou hipnotizada, de um número significativo de mulheres que recorre ao aborto, está diminuída ou mesmo anulada. A consciência está confusa, perplexa ou, mesmo, dominada. Daí que se deva considerar o expediente processual da inexigibilidade subjectiva do seu comportamento suspendendo a pena. Importa ainda considerar as mudanças necessárias para que se busquem novos tipos de penalização, para a mãe que abortou, cujo objectivo seja fundamentalmente terapêutico. Por outro lado, até, embora não só, para obviar a essas explorações degradantes de pessoas em dificuldades tamanhas convirá fazer uso de uma grande severidade e rigor, agravando as penas actuais, que nos parecem demasiado leves, para todos os que ignobilmente se aproveitam da fragilidade atordoada das mães grávidas em dificuldade (mães porque embora ainda não tenham dado à luz, já o são). Por exemplo, todo o pessoal que está implicado na realização do homicídio/aborto, médicos/as enfermeiros/as, parteiras e demais abortadores que ganham dinheiro à custa do sangue inocente ou todos os que pressionam a mãe a matar/abortar, devem ser implacavelmente punidos. Sabe-se, no entanto, que a mãe que mata o seu filho abortando nem sempre se encontra em situação dramática. Também há muita leviandade e muitos outros motivos preocupantes.
Seja como for, a mulher que aborta, assim como todos os que são seus cúmplices ou instigadores, acabarão por pagar caro, tornando-se também vítimas, embora em grau diverso, do crime perpetrado. Trata-se daquilo a que se poderia chamar a síndroma de Macbeth. Não é necessário que os motivos que conduzem ao crime sejam os mesmos que os desta personagem shakespeariana, para que as consequências sejam muito semelhantes. A estes efeitos funestíssimos de índole espiritual, psicológica e social devem acrescentar-se os físicos, que podem ir desde a esterilidade até ao cancro da mama. Por isso, o Estado cuja missão consiste em servir o bem comum, isto é, o bem de todos e de cada um, garantindo, entre outros, o direito à saúde, não pode permitir que qualquer mãe grávida seja sujeita a uma cirurgia que não tem como objectivo curar nenhuma doença - uma vez que a criança nascitura não é de todo uma enfermidade - e que coloca gravemente em risco a sua saúde física e psíquica. E, se não pode autorizar, muito menos pode cooperar através dos seus serviços de saúde.
Entre a mãe e o filho há uma unidade tão profunda que quem quiser amar e proteger um tem que amar e proteger o outro. E quem agredir um, agride necessariamente o outro. Amar verdadeiramente ambos exige um empenhamento firme e determinado no combate às causas do homicídio/aborto, na sua proibição ainda mais firme - procurando, por exemplo, abolir a lei iníqua e cruel - e na ajuda concreta às mães grávidas em dificuldade.

Sua Santidade o Papa São João Paulo PP II e o aborto

Dentre todos os crimes que o homem pode cometer contra a vida, o aborto provocado apresenta características que o tornam particularmente perverso e abominável." (Evangelium Vitae, nº 58)

No caso de uma lei intrinsecamente injusta, como aquela que admite o aborto ou a eutanásia, nunca é lícito conformar-se com ela, nem participar numa campanha de opinião a favor de uma lei de tal natureza, nem dar-lhe a aprovação com o seu voto. (Evangelium Vitae, nº 73)

Quando uma maioria parlamentar ou social decreta a legitimidade da eliminação, mesmo sob certas condições, da vida humana ainda não nascida, assume uma decisão tirânica contra o ser humano mais débil e indefeso. (Evangelium Vitae, nº 70)

Não pode haver paz verdadeira sem respeito pela vida, especialmente se é inocente e indefesa como a da criança não nascida. (Discurso ao Movimento Defesa da Vida, Italiano, 2002)

A tolerância legal do aborto ou da eutanásia não pode, de modo algum, fazer apelo ao respeito pela consciência dos outros, precisamente porque a sociedade tem o direito e o dever de se defender contra os abusos que se possam verificar em nome da consciência e com o pretexto da liberdade. (Evangelium Vitae, nº 71)

Reivindicar o direito ao aborto e reconhecê-lo legalmente, equivale a atribuir à liberdade humana um significado perverso e iníquo: o significado de um poder absoluto sobre os outros e contra os outros. Mas isto é a morte da verdadeira liberdade. (Evangelium Vitae, nº 20)

É totalmente falsa e ilusória a comum defesa, que aliás justamente se faz, dos direitos humanos - como por exemplo o direito à saúde, à casa, ao trabalho, à família e à cultura, - se não se defende com a máxima energia o direito à vida, como primeiro e fontal direito, condição de todos os outros direitos da pessoa. (Christifideles Laci, nº 38)

Quando a lei, votada segundo as chamadas regras democráticas, permite o aborto, o ideal democrático, que só é tal verdadeiramente quando reconhece e tutela a dignidade de toda a pessoa humana, é atraiçoado nas suas próprias bases: Como é possível falar ainda de dignidade de toda a pessoa humana, quando se permite matar a mais débil e a mais inocente? Em nome de qual justiça se realiza a mais injusta das discriminações entre as pessoas, declarando algumas dignas de ser defendidas, enquanto a outras esta dignidade é negada? Deste modo e para descrédito das suas regras, a democracia caminha pela estrada de um substancial totalitarismo. O Estado deixa de ser a "casa comum", onde todos podem viver segundo princípios de substancial igualdade, e transforma-se num Estado tirano, que presume poder dispor da vida dos mais débeis e indefesos, como a criança ainda não nascida, em nome de uma utilidade pública que, na realidade, não é senão o interesse de alguns. (Evangelium Vitae, nº 20)

Matar o ser humano, no qual está presente a imagem de Deus, é pecado de particular gravidade.
Só Deus é dono da vida!
(Evangelium Vitae, nº 55)

A rejeição da vida do homem, nas suas diversas formas, é realmente uma rejeição de Cristo. (Evangelium Vitae, nº 104)

Aborto: questão de consciência?

A - Consciência individual e os Direitos dos outros
a) Temos ouvido repetidamente afirmar que o aborto é uma questão da consciência individual de cada um. Pondo agora de parte a confusão tão frequente, a que já nos referimos, que se faz entre consciência verdadeira e opiniões, ou mesmo simples convicções, devemos afirmar que dizer: "o aborto é uma questão da consciência íntima de cada um" é só uma meia verdade. Mas a meia verdade pode ser mais perigosa que a mentira descarada.
É verdade porque em qualquer decisão humana, seja ela qual for, está implicada a consciência como um ouvido que escuta a verdade e como um olhar lançado sobre a realidade.
Na questão do aborto, porém, há uma relação na qual estão implicados os direitos de outro ser humano. Por isso, a questão do aborto é antes do mais uma questão de direitos humanos ou de direito natural que deve ter expressão jurídica no direito positivo.

b) Explicitando melhor: Quando alguém se depara com uma questão de moral pessoal ou privada, na qual não estão em jogo os direitos de outrem, a solução ordenamental deverá ser a de remetê-la para a responsabilidade do sujeito que a enfrenta. O seu lugar é o da mera consciência individual. Trata-se, de facto, de um valor moral, que pode ser muito importante, mas não se está diante dos direitos de ninguém.
Temos então o dever de ajudar o sujeito a decidir, prestando-lhe o máximo de informação para que o faça responsavelmente. Mas não podemos prescrever-lhe a solução; ele é que a deverá encontrar.
Pelo contrário quando se está na presença de uma questão que embate com os direitos de alguém, como no caso do aborto, não bastam as recomendações, mas é necessário recorrer a prescrições e mesmo a proibições. O direito diz respeito à relação que se manifesta em dinâmicas de tipo social. Compete-lhe, de facto, tratar com seriedade as relações de tipo social, defendendo sempre os sujeitos mais fracos e inocentes contra os abusos ou prepotências dos mais fortes. (cf. Giuliano Amato e Francesco D'Agostino).

c) O bebé, ainda não nascido, é um ser humano que começa a desabrochar para a vida, isto é, o que de mais inocente, em absoluto, se possa imaginar. É eminentemente vulnerável e débil, mais do que qualquer outro sujeito. E, por isso, o direito tem o dever de tutelá-lo. O aborto deve ser sempre considerado acto ilícito, de índole penal, embora em determinadas situações se possa ou deva suspender a aplicação da pena, pelo recurso ao expediente processual da inexigibilidade subjectiva de um comportamento de per si socialmente negativo. (cf. E.V. 58, F. D'Agostino, E. D. Nogueira e C. Casini).

Aborto e direitos humanos

A declaração universal dos Direitos do Homem (10.12.1948) abre com a afirmação de que "o fundamento da liberdade, da justiça e da paz no mundo consiste no reconhecimento da dignidade de todos os seres pertencentes à família humana e dos seus direitos iguais e inalienáveis". Trata-se do princípio da igualdade, que se fundamenta no reconhecimento da dignidade do ser humano, isto é, do seu superior valor, que o distingue da restante natureza, porque a transcende.
Por ser tão sublime, e por não admitir gradualidade, a dignidade é sempre igual para todos. Este princípio acolhido por todas as constituições modernas, exprime a verdade de que o homem é sempre um fim e nunca um meio, sempre sujeito e nunca objecto, sempre pessoa e nunca coisa.
Como escreveu o Tribunal Constitucional Alemão na sua decisão de 25.02.1975, precisamente a propósito do aborto, "esta escolha fundamental da Constituição determina a estrutura e a interpretação de todo o ordenamento jurídico". Esta decisão interpretava a palavra "cada um" contida no artg. 2 da constituição Federal : "cada um tem direito à vida". O Tribunal Constitucional interpretou-a do seguinte modo: "entre cada uma das partes da vida em desenvolvimento antes do nascimento e entre o nascido e o nascituro não se pode distinguir nenhuma diferença. Cada um, no sentido do art. 2 é cada vivente, por outras palavras: cada indivíduo humano que possui a vida; 'cada um' é portanto também o ser humano ainda não nascido". E continua: "diante da omnipotência do Estado totalitário que pretendia o domínio sem limites em todos os sectores da vida social e para o qual o respeito pela vida de cada um, em princípio, não significava nada em comparação com a persecução dos seus fins estatais, a Constituição construiu um ordenamento ligado a um sistema de valores que coloca cada homem no centro de todas as suas normas."
O reconhecimento da dignidade de cada ser humano é o que distingue o ordenamento estatal de "uma associação de malfeitores bem organizada" (Agostinho de Hipona). Só esse reconhecimento permite a união entre a ética e o direito, impedindo a redução da lei à mera força e enraizando-a (a lei) na justiça.
A dignidade humana significa que o sujeito tem de ser reconhecido por aquilo que é; significa que o ser humano é sempre fim e merece por isso protecção por si mesmo, porque ele, enquanto tal, tem o originário direito de viver.
No direito antigo o escravo, apesar de ser reconhecido como homem, era considerado uma coisa, objecto de propriedade, de captura como os animais, à livre disposição do senhor. A sua morte por um terceiro era considerada um dano e não um homicídio. Em 1857 o Supremo Tribunal dos USA decretou por uma maioria de 7 votos contra 2 que os escravos legalmente não eram pessoas e portanto estavam privados de protecção Constitucional. Em 1973 o Supremo Tribunal do mesmo país, com igual maioria (7-2), decidiu o mesmo em relação aos bebés, ainda não nascidos.
Assim se compreende como é importante ligar o valor do indivíduo à pertença à espécie humana, pois este tem sido o método de um longo combate histórico que, em nome da dignidade e da igualdade, libertou escravos, estrangeiros, mulheres, etc. De facto, o princípio da igualdade, ou da não discriminação, é eliminado quando se consente ao poder civil estabelecer quais são os sujeitos iguais.
Ao poder nazi bastou decidir que a característica humana qualificante era a raça ariana para espezinhar a igualdade. Se afirmarmos que os negros não são sujeitos de direito é inútil proclamar a igualdade, e o mesmo se passaria com as mulheres, com perseguidos políticos, com os emigrantes, com os fetos. O homem não pode ser decidido pelo direito. O direito só pode e deve reconhecê-lo como sujeito. Pois se assim não for os direitos humanos não passarão de uma miragem.
Que é então o homem? Antes de responder têm que se recusar as teorias que exigem, aliás arbitrariamente, como características definidoras de humanidade a auto-consciência, a capacidade de relação e a aceitação social, porque, quando aplicadas ao homem, também, na fase pós-natal, implicam uma discriminação inaceitável.
Que é o homem? "O homem é o indivíduo vivente pertencente à espécie humana". Esta definição, que se refere somente às características biológicas da espécie humana, é, decerto, uma escolha filosófica, mas é a única que exclui toda a discriminação e, portanto, a única coerente com o princípio da igualdade. Como o direito não pode confiar à consciência individual e às opiniões de cada um o reconhecimento dos sujeitos sem se negar a si mesmo e ao princípio da igualdade, não faz nenhum sentido apelar ao pluralismo cultural para contraditar esta evidência. (cf. Carlo Casini).

Eles sabem

Que a vida humana começa no momento da fecundação é um facto não só reconhecido pela ciência, mas também pelos próprios defensores do aborto. Porém, a dissimulação faz parte da estratégia abortista. Negam perante os outros aquilo que lhes é evidente: "Não lhes chameis bebés. Fazei de conta que o não são. Uma vez admitido que o sejam, as vossas argumentações poderiam ser vistas por aquilo que realmente são: razões para o infanticídio." (Regra principal dos abortistas nos USA, In RANDY ALCORN, "Dalla Parte Della Vita, Astea, 1994, p. 38).
No entanto, às vezes escapa-lhes, publicamente, a boca para a verdade. De um editorial pró-aborto no 'California Medicine': "Dado que a antiga ética não foi inteiramente varrida, foi necessário separar a ideia de aborto da de morte, pois esta continua a ser socialmente detestável. O resultado é uma singular negação do dado científico, patente a todos, de que a vida humana se inicia na concepção." ("A New Ethic for Medicine and Society", editorial, in California Medicine, Setembro 1970, p. 68).
Noutro editorial o New Republic declara: "Não há claramente nenhuma distinção lógica ou moral entre um feto e um pequeno bebé; a possibilidade livre de abortar não pode ser racionalmente distinguida da eutanásia. Apesar disso nós somos a seu favor." ("The Unborn and the Born again", editorial, 2 Julho 1977, p. 6).
Finalmente, a psicóloga abortista M. Denes escreveu: "Penso verdadeiramente que o aborto seja um homicídio de uma qualidade muito especial... . E não é possível que nenhum médico nele envolvido se possa enganar a si mesmo a esse respeito." (MAGDA DENES, "The Question of abortion", in Commentary, nº 62, Dezembro 1976, p. 6).

Aborto por razões psíquicas

Actualmente a lei portuguesa permite o aborto quando há um perigo real para a saúde psíquica da mãe. (Artigo 142, 1. a) e b)).
Naturalmente, uma pergunta se impõem desde já: existe alguma patologia do foro psíquico que tenha o aborto como terapêutica indicada? Sem uma resposta afirmativa a esta pergunta, a lei portuguesa não faz qualquer sentido. Cabia a quem promoveu a aprovação da lei apresentar referências de trabalhos científicos em psiquiatria que permitam sustentar que uma tal lei é necessária e/ou conveniente. Pois bem: por muito surpreendente que isso possa ser, NUNCA NENHUM DEPUTADO APRESENTOU AS REFERÊNCIAS NECESSÁRIAS! E isto, por si só, chega para dar uma imagem desastrosa da qualidade do trabalho feito na Assembleia da República. Mas há mais: nunca ninguém deu essas referências pelo simples facto de que elas NÃO EXISTEM. As citações que se seguem não deixam lugar a dúvidas:

A. CITAÇÕES
- "Não existe nenhuma doença do foro psiquiátrico que tenha o aborto como terapêutica indicada" (Cf. R.Sloan, New England Jour. Med., May 29, 1969.)

- "Em toda a literatura de psiquiatria não existe uma única condição para a qual o aborto seja a terapia reconhecida. Pelo contrario, existe uma evidência esmagadora de que os verdadeiros problemas psicológicos, em vez de serem aliviados, são complicados e agravados pelo aborto.". (Cf. D. Readron, Aborted Women: Silent no more. Chicago: Loyola University Press, 1987, p.167)

- "Não existem razões verdadeiras para um aborto por razões de natureza psiquiátrica. As modernas terapias da psiquiatria tornaram possível levar a termo a gravidez de qualquer mulher mentalmente doente". (Cf. F. Ayd, Medical Moral Newsletter.)

- Isto significa que a Assembleia reuniu, discutiu e aprovou uma lei que não tem qualquer fundamento científico. Mas o mais grave é que com isso abriu a porta para que possam ser provocadas genuínas perturbações mentais a coberto da legalidade:
Segundo a Organização Mundial de saúde, "As mesmas mulheres para quem o aborto legal é considerado justificado por razões de natureza psiquiátrica são exactamente aquelas que têm o maior risco de apresentar desordens psiquiátricas post-aborto". (OMS, 1970).

- "O quadro psiquiátrico pós-aborto é tanto mais grave, quanto mais grave era a perturbação psíquica anterior ao aborto".
(Cf. E. Sandeberg, "Psichology of abortion." In Comprehensive Handbook of Psychiatry, 3rd Ed. Kaplan & Friedman Publishers, 1980).

- Para se ver a superficialidade com que este tema foi debatido e votado, convém observar os resultados de um estudo realizado nos EUA. Das mulheres que abortam: 81% mostram preocupação com e pela morte do bebé; 73% têm recordações - re-experiências - indesejadas do aborto; 69% sentem-se a enlouquecer; 54% têm pesadelos relacionados com o aborto; 35% recebem visitas do bebé morto; 23% têm alucinações incontroláveis. (Cf. A. Spekhard, Psycho-social Stress Following Abortion. Kansas City, Missoury: Sheed and Ward, 1987)

- "Quando uma paciente apresenta problemas emocionais, e tem uma história de aborto, então as sequelas do aborto devem ser consideradas como o mais grave trauma emocional da pessoa até que se consiga provar algo em contrário. Os pacientes nunca fazem esta associação porque estes conflitos emocionais estão alojados no inconsciente". (Cf. R. Maddock & R.Sexton, "The Rising Cost of Abortion", Medical Hypno-analysis, Spring 1980, pp. 62-67).

- Talvez convenha repetir: "(...) as sequelas do aborto devem ser consideradas como o mais grave trauma emocional da pessoa até que se consiga provar algo em contrário."

- E para terminar o testemunho de um psiquiatra abortador (que fez mais de 20.000 abortos): "Eu tenho pacientes que abortaram há um ou dois anos mas o aborto continua a incomodar. Muitas vêm ter comigo simplesmente mudas, outras são hostis. Algumas desatam a chorar... Não existe qualquer dúvida no meu espírito de que nós estamos a perturbar uma vida. O trauma pode mergulhar no inconsciente e nunca mais voltar à superfície durante a vida da mulher... mas para isso paga-se um preço. Pode ser alienação, pode ser embrutecimento, podem ser disfunções do instinto maternal. Qualquer coisa acontece nos níveis mais profundos da consciência quando a mulher aborta. Eu sei isso como psiquiatra". (Cf. J. Fogel, citado em K. Kelly "PAS, Professionals, and Sorrow's Reward", The Wanderer, April 13, 1989, p. 2)

- Ainda assim, existem alguns médicos (até bem intencionados) que, conquanto reconheçam que o aborto não é indicação terapêutica para nada, pensam que existe sempre a situação prática da mulher que ameaça suicidar-se caso não lhe seja feito o aborto. Sobre isso diga-se o seguinte: Entre 1938 e 1958 foi recusado o aborto a mais de 13.500 suecas. Apenas três se suicidaram. (Cf. J.Ottosson, "Legal abortion in Sweden", J. Biosocial Sciences, v.3, 1971, p.113.)

- Em Brisbane, Australia, nunca uma grávida se suicidou. (Cf. F. Whitlock & J.Edwards, "Pregnancy & attempted suicide", Comp. Psychiatry, vol. 9, no. 1, 1968)

- Em Birmingham num estudo realizado ao longo de sete anos verificou-se que 119 mulheres com menos de 50 anos se tinham suicidado. Nenhuma estava grávida. (Cf. M. Sim, "Abortion & the Psychiatrist", British Med. J. v.2, 1963, p. 145).

- Além do mais, caso se aceitasse abortar sob ameaça de suicídio, ficariam por resolver as complicações que se seguem ao aborto e que já foram referidas acima. Para prevenir um eventual suicídio, o médico mata o filho e... arrasta a mãe para genuínas complicações psíquicas. Qualquer pessoa reconhece que tudo isto é demasiado confuso e tortuoso para ser considerado como verdadeira solução do problema!

- Em 1996 realizou-se uma conferência mundial de psiquiatria em Barcelona e no final foi emitida uma resolução: "Os psiquiatras devem ficar de fora dos processos de eutanásia. Nenhum atestará a necessidade da eutanásia nem participará na assistência ao suicídio. Quando um doente pede que o matem, ou que o ajudem a morrer, isso é normalmente o sintoma de uma perturbação psíquica e o doente precisa, simplesmente, de ser tratado. Nenhum médico trata os seus doentes matando-os."
Pois bem: se quando uma pessoa pede que a matem "isso é normalmente o sintoma de uma perturbação psíquica e o doente precisa, simplesmente, de ser tratado", então, por maioria de razão, quando uma pessoa (a mãe) pede que matem outra (o filho), sob ameaça de suicídio, isso é sintoma de uma perturbação psíquica e a mãe precisa, simplesmente, de ser tratada. Abortar sob ameaça de suicídio é, simplesmente, adiar e agravar um problema.

B - O Ponto de vista ético
a) Não se pode matar a pessoa A para proteger a saúde psíquica da pessoa B. Se assim fosse poderíamos matar certos pais (homens!) de bebés não-nascidos porque: "O risco de dar à luz um filho com problemas físicos e psicológicos aumenta 273% nas mulheres que têm um casamento infeliz." (Cf. T. Verney & J. Kelly, The Secret Life of the Unborn Child, Delta Books, 1981, p. 49).
Analogamente, se o risco para a saúde psíquica fosse critério de morte, poderíamos matar muitos filhos adolescentes, muitos pais problemáticos e muitos, muitíssimos, vizinhos, sobretudo em algumas reuniões de condomínio!… Em resumo, pode-se dizer que é tão legitimo proteger a saúde psíquica da mãe à custa da vida do filho, como é legítimo proteger a saúde psíquica do filho à custa da vida da mãe. Salvo, claro está, se se conseguir provar que filho e mãe são diferentes em dignidade e direitos o que, até hoje, ninguém conseguiu (estamos a falar de direitos naturais de cada pessoa e não de "direitos" arbitrariamente atribuídos ou retirados por "leis" injustas).

b) Não se pode forçar uma pessoa a fazer algo a que não está obrigada. Por exemplo, o proprietário de escravos não os pode obrigar a trabalhar para si, pois isto é algo a que os escravos (pessoas) não estão obrigados. Do mesmo modo, ninguém está obrigado a renunciar à sua vida (por exemplo, doando o coração) para salvar a vida de terceiros. Muito menos estaria obrigado a renunciar à sua vida para um benefício não vital de uma outra pessoa. Portanto, de forma alguma se pode obrigar uma pessoa (bebé) a renunciar à vida (matando-o) em nome de um benefício não vital para a mãe (a saúde psíquica), sendo que esta renúncia é algo a que nem o bebé nem ninguém está obrigado. O artigo da lei portuguesa que permite o aborto por razões psicológicas é, como tudo no aborto, o triunfo da força sobre a razão.

c) Convém relembrar que, ao contrário do que pretendem os pró-aborto, não está em jogo saber de quem são os direitos que prevalecem (se os da mãe ou os do filho) mas, precisamente, quais são os direitos que devem prevalecer. E o direito à saúde psicológica (ainda que essa estivesse em causa) nem remotamente se compara ao direito à vida.

C - Estatísticas
Em 1988 o Instituto Guttmacher fez um estudo sobre as razões que levam as mulheres a abortar. O Instituto é fortemente pró-aborto e publicou os resultados do estudo no jornal da associação Planned Parenthood que é a maior organização pró-aborto do Ocidente (e o maior proprietário de clínicas de aborto). Os resultados deixam qualquer um, no mínimo, estupefacto: Aborto eugénico: menos de 3% dos abortos. Perigo para a saúde física ou psíquica: cerca de 3% dos abortos. Violação ou incesto: cerca de 1% dos abortos. Considerações de natureza social: 93% dos abortos. (Cf. Family Planning Perspectives, July/August 1988 issue, p. 170.)
Naturalmente, ninguém invoca razões "sociais" para fazer um aborto (por exemplo, "eu quero abortar porque estou preocupada com as alterações que o bebé pode implicar na minha vida" - resposta dada por 16% das inquiridas!-). Logo, a solução é abortar por alegado "perigo para a saúde psíquica da mãe". Por esta razão, na Califórnia, entre 1967 e 1969, houve cerca de 15.000 abortos legais: em 90% dos casos a razão dada foi "perigo para a saúde psíquica". Já em New York (onde a lei estava próxima do aborto a pedido) somente 2% dos abortos foram por razões psicológicas. (Cf. California Dept. of Public Health, Third Annual Report to California Legislature, 1970.)
Ou as californianas são todas doidas, ou quando se aprova o aborto por razões "psicológicas" o que se pretende mesmo é legalizar o aborto a pedido. E nestes termos os projectos votados em Portugal em 20/2/1997 só pretendiam remover uma dificuldade legal (a necessidade de atestado médico) para uma situação de facto (qualquer aborto pode ser justificado por razões "psicológicas" pelo que o melhor será legalizar, tout court, qualquer aborto). Para terminar não se pode deixar de observar o seguinte: é inacreditável que o Governo declare "guerra" às falsas baixas (isto é, pessoas saudáveis a quem um médico atesta uma doença que as impede de trabalhar) ao mesmo tempo que a ninguém ocorre a possibilidade de haver falsas justificações médicas para um aborto. Isto bem traduzido significa: um médico pode mentir quanto quiser e lhe apetecer desde que não cause prejuízo (financeiro) ao Estado.

Uma questão religiosa?

Para muitos pró-aborto a legitimidade do aborto é absolutamente óbvia e as pessoas que se opõem ao aborto, os pró-vida, fazem-no por razões religiosas. Assim, discutir com os pró-vida é pura perda de tempo uma vez que na base da sua posição está a questão da existência de Deus ou a observância de umas regras morais da Idade Média. Pois bem: nada disto corresponde à verdade.
Para começar, leia-se este excerto do caso Roe vs Wade (redigido por um juiz pró-aborto, como se sabe): "Nem sempre se tem em conta que as leis que proíbem o aborto na maioria dos Estados são relativamente recentes. Essas leis, que em geral proíbem o aborto consumado ou tentado em qualquer altura da gravidez salvo quando é necessário para salvar a vida da grávida, não têm origem em tempos remotos. Antes, essas leis foram aprovadas, na maior parte dos casos, nos finais do século XIX..."
Como se vê a proibição do aborto não vem da Idade Média: vem de finais do século XIX! Mas, de qualquer forma, será que na origem das leis que proíbem o aborto estão motivos religiosos?
Em poucas palavras pode-se dizer o seguinte. O aborto foi sempre muito perigoso e, por isso mesmo, era raro: quando se fazia, normalmente, implicava a morte da mãe. Por esta razão o aborto não merecia atenção especial dos legisladores nem da sociedade.
Por seu lado, a Igreja Católica Romana e a Igreja Ortodoxa Oriental condenavam o aborto (o aborto aparece explicitamente condenado na primeira página de um escrito cristão datado dos anos 75 a 150 - o Didaque -) mas os seus teólogos e moralistas discutiam diferentes graus de gravidade (conforme o bebé já estivesse "vivo" ou não). Para ilustrar este facto, bastará dizer que para defender o aborto, em 1984, Zita Seabra citou S. Tomás de Aquino, o mais genial teólogo da Historia.
Por volta de 1750 encontrou-se uma técnica de aborto que, embora continuasse a matar muitas mães, constituiu um enorme progresso. A consequência imediata desta descoberta foi que, depois da revolução francesa, O ABORTO FOI LEGALIZADO EM MUITOS PAÍSES.
Mas o aborto foi legalizado tendo por base os conhecimentos científicos da época. (A grosso modo, cada espermatozóide é um homem que se limita a crescer dentro do útero). Em 1843, o cientista Martin Berry descobriu o processo de reprodução tal como é hoje conhecido. Imediatamente, MÉDICOS e CIENTISTAS iniciaram uma grande campanha para proibir o aborto. A American Medical Association em dois relatórios (1857 e 1870), estabeleceu sem margem para dúvidas que o aborto era inaceitável. Na sequência dos dois relatórios da AMA, o aborto foi proibido praticamente por toda a parte.
Desde aí fez-se alguma descoberta que invalidasse as conclusões de então? NÃO! Todas as descobertas (genéticas, bioquímicas, citológicas, fetológicas) têm provado e confirmado até à náusea a afirmação dos cientistas do século XIX: a vida humana começa no momento da concepção! E este é o facto científico que está na origem das leis anti-aborto que existem (ou existiam).
Para que se possa apreciar até que ponto a posição pró-aborto está cheia de preconceitos (anti-religiosos), leia-se este excerto de um livro publicado por um professor universitário de filosofia:
" Quando no meu departamento decidimos criar uma disciplina sobre Contemporary Moral Issues, no Massachusetts Institute of Technology (MIT), eu opus-me à inclusão no curriculum da questão do aborto. Parecia-me que no aborto, de facto, não havia questão nenhuma - a oposição ao aborto só tinha como suporte algumas pretensões teológicas de valor duvidoso. Contudo, quando o aborto se tornou um dos tópicos do curso, eu percebi rapidamente que estava enganado. De facto, à medida que eu estudava o assunto tornou-se cada vez mais evidente, para minha grande surpresa, que havia razões para pensar que o aborto nem sempre é aceitável. Este livro é o resumo das considerações que me levaram a essa conclusão."

Quem mata já está morto

A legalização do aborto é um fenómeno histórico tão horroroso como intrigante. Como é possível que uma sociedade negue a evidência da existência de uma pessoa no feto humano, legitime, proteja, e inclusive chegue a estimular as mães a matarem os filhos que levam no seio, contra toda a razão e justiça, contra a inclinação natural e espontânea da mulher e contra as próprias solenes declarações da inviolabilidade da vida? Fazem bem os que tentam despertar as consciências para tão aberrante legislação, mas a verdade é que, como em qualquer outro problema, não erradicaremos esta desgraça sem lhe descobrirmos as causas.
Assim como uma rapariga pode entrar em pânico ao ver-se grávida, talvez se dê um pânico geral, de toda uma geração, perante as múltiplas ameaças que a assediam, desde a guerra nuclear ao "efeito de estufa", da poluição à explosão demográfica, do terrorismo à SIDA, etc., provocado por uma comunicação social especializada em cataclismos, crimes, fúrias multitudinárias, escândalos e suspeitas. Só esse pânico justificaria uma cegueira tal que nos tornasse insensíveis ao massacre de milhões de inocentes.
Mantenho substancialmente esta opinião, que de certo modo atenuará as nossas culpas aos olhos das futuras gerações, e que explica a aparente inutilidade da mais elementar argumentação em favor da vida, pois quem entra em pânico não quer ouvir alertas nem razões, mas só escapar à vaga e aterradora "catástrofe" que julga iminente. Vejo, porém, uma outra explicação complementar e mais imediata: a desvalorização da vida humana. Neste ponto falta-me certamente originalidade, excepto possivelmente no sentido que pretendo focar - o de que aqueles que menosprezam a vida alheia começaram por desprezar a sua. Talvez não se tenha ainda reparado bem no que significa de auto-desprezo o crime de homicídio.
Quero dizer que tanta ou mais compaixão merece quem mata do que quem é morto. Embora, à primeira vista, só se possa classificar de egoísmo feroz a eliminação "in ovo" da mínima probabilidade de um nascimento incómodo, vendo melhor, quem mata já está morto. Não vê nos outros indivíduos seres respeitáveis, porque já não se respeita a si mesmo, porque se considera a si mesmo um ser desprezível.
Não imaginamos bem as consequências psicológicas de uma visão materialista do homem. Sem referência a Deus nem ao espírito, o ser humano é realmente insignificante, ou, quando muito, um animal tão admirável como a pescada, o estorninho ou a barata. A sua única "mais-valia" consistirá numa maior complexificação evolutiva, sofisticação orgânica que, no entanto, faria dele um ser de frágil e confuso comportamento e o mais perigoso dos predadores. E toda a nossa "filosofia de vida" se baseia nisto. Assim se educam as crianças, esse é o credo oficial da nossa cultura, tal é o pressuposto de qualquer divulgação científica. As maiores loas de exaltação evolucionista do homem não conseguem ocultar o que por baixo delas se confessa: "eu sou um bicho, tu és um bicho, ele é um bicho, nós somos bichos..."
Ora os bichos matam-se uns aos outros. Por defesa e necessidade, é claro. Eis o grande e exclusivo princípio ético admissível... e que o homem ainda não assimilou. Só isso lhe falta para a sua evolução completa. Eis, portanto, o grande programa "educativo"...
Não imaginamos a falta que nos faz o cristianismo e a defesa da Sã Doutrina. Embora o direito à vida de todas as pessoas seja um princípio acessível à razão, na realidade só o cristianismo o iluminou definitivamente e com toda a clareza, e lhe foi extraindo as consequências. Quando o homem se precata de ser amado por Deus, até ao ponto de se irmanar com o seu Filho, logo intui a grandeza da sua condição e a do semelhante, sem se escandalizar com a sua evidente mesquinhez física nem com a sua fragilidade moral. Pelo contrário, quem se esquece ou recusa a crer na filiação divina, e se julga tão-só um parasita do cosmos, não consegue ver no semelhante senão o que de si mesmo pensa. O horror do aborto organizado é precedido pelo horror de uma visão medonha da vida. E, como dizia antes, quem a padece suscita em mim maior compaixão do que as inocentes vítimas, que Deus acolherá na sua infinita misericórdia.

Igreja Católica Ortodoxa Hispânica

Na qualidade de cristão católico ortodoxo, e defensor da Fé e da Sã Doutrina, ao tomar uma posição sobre a pratica do abordo, e após estudar aprofundadamente o delicado assunto, e tendo em conta tudo o que foi descrito neste texto, não posso deixar de condenar toda e qualquer prática abortiva, dando o meu apoio pessoal e o apoio de toda a Jurisdição Canónica que represento, à defesa da vida e às campanhas em curso contra a legislação abortista, esperando que as mesmas tenham algum efeito positivo.
Porém, não posso deixar de recordar a todos os filhos da Igreja Católica Ortodoxa Hispânica, que de acordo com o Código de Direito Canónico próprio da Santa Igreja, e no disposto no cánone 1046, no que se refere à prática efectiva do aborto, é aplicada a pena de Excomunhão Maior, de acordo com disposto no cánone 1094, ficando reservada ao Bispo Diocesano absolver do pecado de procurar o aborto, se este foi efectivamente realizado, de acordo com o cánone 408 § 2.



Arcebispo Primaz Katholikos

S.B. Dom ++ Paulo Jorge de Laureano – Vieira y Saragoça
(Mar Alexander I da Hispânea)


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Última actualização deste Link em 01 de Outubro de 2011